segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Sem (ou seria: Cem?) motivos pra reclamar

Um lugar longe, muito longe da minha realidade. Casas que não parecem casas. Pessoas estranhas. Medo de pessoas que eu nem conheço. Pessoas que podem ser pais de família, que podem estar lutando pra SOBREviver nesse mundo. Eles é que deveriam ter medo de mim.

Eu, com esse preconceito enraizado. Essa mania de atravessar a rua toda vez que vejo uma pessoa que me parece estranha e que pode me causar riscos. Esse olhar julgador que nunca pensa bem de alguém que, na maioria das vezes, não quer me causar nada.
Eu, com essa cara de metida, essas roupas que pagam a comida do mês inteiro dos filhos deles, o carro (que não é meu), a bolsa (que não fui eu que comprei), os óculos escuros, o tênis. Essa imagem. Eu. Simplesmente eu. Eu que deveria causar medo neles. Eu que mostro pra eles como é o mundo aqui desse lado. Eu que fico reclamando que irei morar a algumas quadras de casa. Eu que reclamo que meu pai ainda não me deu um carro. Eu que reclamo que meus dois celulares não tem sinal. Eu que posso escolher entre risoto e massa. Eu que prefiro ficar em São Paulo do que viajar pra "aquele lugar". Eu que posso escolher. Eu que posso pedir. Eu que sou branca. Eu que acho que sou superior. Eu que falo que a pior coisa da minha vida é ter pego aquela DP. Eu. Eu. Eu.

E eles que moram lá? E eles que não sabem se vão ter o que comer no fim do mês? E eles que, talvez, nunca terão carro na vida? E eles que têm que roubar pra tentar ser como eu? E eles que nunca viajaram na vida? E eles que nem sabem o que é DP? E eles que não têm escolha??
Olhando pra eles eu sei que não tenho motivos pra reclamar. Que meus cem motivos tornam-se pequenos demais ou até nulos. Olhando pra eles percebo como sou egoísta por julgar mal, por atravessar a rua ou por não querer olhar nos olhos. De que adianta achar que posso tudo, sendo que a história deles rende muito mais do que a minha? Se a história deles traz muito mais lição do que a minha?

Mas a culpa não é totalmente minha. A sociedade me fez assim. São Paulo me fez assim. Minha mãe me fez assim? Me fez ter medo de uma pessoa que chega perto do carro e pede 'um trocado'. Me fez ter medo de alguém que não se veste como eu. Me fez falar 'VAI TRABALHAR!' pra quem tenta ganhar a vida de modos que não cabem a mim julgar.

Ver tudo aquilo me fez perceber que eu posso refletir, que eu posso até tentar. Mas, infelizmente, não vou conseguir tirar essa armadura que criei em volta de mim. O medo de quem não merece, infelizmente, vai ficar. Me arrependo, quero pedir desculpa. Mas nesse mundo louco não sei ainda eu quem eu posso confiar.

2 comentários:

Sofia Rambo disse...

Bázinha!

A sociedade nos faz ter medo do que desconhecemos. Um dia um sábio me disse: Medo é uma ilusão..e isso faz muito sentido.

Adoro o que vc escreve.
Parabéns!!

Beijos

Sofia

Lá Brichesi disse...

Realmente, sem motivos para reclamar.
We are BLESSED, One!